Pela definição da Cartilha de Acessibilidade da Universidade Federal do Ceará , o conceito de acessibilidade é: “dar às pessoas com deficiência condições de uso dos espaços urbanos, dos serviços de transporte, dos meios de comunicação e informação, do sistema de educação, eliminando barreiras e garantindo a inclusão social daqueles que apresentam alguma condição de deficiência.”

No entanto, como tornar esse acesso algo concreto? Como fazer uma escola realmente inclusiva? A Palavras conversaram com o coordenador pedagógico da Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio (EMEFM) Vereador Antônio Sampaio (SP), Alexandre Campos, e com o professor de Atendimento Educacional Especializado (AEE) da mesma unidade na capital paulista, Marco Aurélio Ribeiro, para explicar como é o trabalho por lá.

Atualmente, a EMEFM atua com 17 estudantes surdos no Ensino Médio e 35 estudantes com deficiência do 1º ano do Ensino Fundamental até a 3ª série do Ensino Médio, além de estudantes com deficiência física (cadeirantes e não cadeirantes), autismo, deficiência múltipla, síndrome de Asperger, deficiência intelectual, baixa visão/visão subnormal e cegueira, síndrome de Down.

Confira a entrevista abaixo e saiba mais como é o trabalho da Educação Básica com pessoas com deficiência! Cadastre-se também em nosso site para receber novidades, lançamentos e promoções diretamente no seu e-mail!

Palavras: Você acha que uma escola inclusiva é importante? Como você avalia esse tipo de formato?

Alexandre Campos: Na perspectiva da educação inclusiva, consideramos que não devemos segregar socialmente os estudantes com deficiência e que o convívio com a diversidade contribui para a formação de todos. Nesse sentido, não somos projetados para escolas de Educação Básica exclusivamente para estudantes com deficiência, mas eles podem ter atendimentos complementares em instituições de saúde, terapias, entre outras.

Marco Aurélio Ribeiro: Eu acho que esse tipo de formato é necessário. Aqui você e é um barato: tem uma luz vermelha que acende no canto da sala para informar que está trocando a aula. É preciso reduzir as barreiras da comunicação, [barreiras] sociais…

Palavras: Como é o ensino com os estudantes com deficiência? Qual é o foco do aprendizado com eles?

Marco Aurélio Ribeiro: As coisas se processam no concreto e uma vez que esse vínculo e essa conotação são condicionais, eu posso trabalhar com os estudantes. Todos somos pessoas abstratas que se conectam sem concreto. As trocas são estabelecidas a partir de objetos de interesse. É o mesmo desta entrevista: há vínculos estabelecidos e eu os conheço.

Cada deficiência tem suas características próprias. Mas, claro, são indivíduos. Conseguimos fazer um trabalho através do vínculo. Eu posso construir esse vínculo com regras específicas, da forma como o estudante entende o mundo, para dar frutificação a ele.

(…) O conteúdo é o foco do professor especialista. É saber até onde se pode chegar. Só que de uma forma a explicitar os currículos a serem vivenciados.

Chega uma lista de química a ser trabalhada. Eu passo a orientação: “você vai falar para a mãe colocar uma chaleira com água, ferver e colocar um vidro em cima. Aí mostrar evaporação e condensação. Depois vai pegar a água e congelar”. Isso vale para os três estados. Somos muito prolixos, mas temos que ser acessíveis. Pegar o pulo do gato.

Palavras: Existem cursos de capacitação para professores atuarem com a Educação Especial?

Alexandre Campos: Os professores têm formações constantes relacionadas à Educação especial. Junto à Coordenação pedagógica e profissionais da Educação especial, realizam Estudos de caso de cada aluno com deficiência e, a partir desses estudos, elaboram os Planos individuais de Atendimento educacional especializado, fazendo as adaptações ou adequações de materiais e também na metodologia das aulas, privilegiando o Desenho Universal de Aprendizagem (DUA), de modo a promover as aprendizagens de todos os estudantes, com ou sem deficiências.

Marco Aurelio Ribeiro: O sistema ainda se fecha para a figura do especialista. Dentro da formação e dentro do grupo de Atendimento Educacional Especializado (AEE), eu também sou um pouco diferente porque eu trabalho dentro da prática da arte. Porque eu vou experimentar com o estudante o que ele faz – o que ele não faz eu já estou sabendo [pelos laudos]. Aí eu entro em outras frentes: na ludicidade, no fazer, na escuta, no diálogo…

A prefeitura de São Paulo oferece cursos de capacitação para os professores. Tive um em 2014, outro em 2016, em parceria com a Unesp – esse último com foco em deficiência auditiva/surdez. E você vai se ligando.

Palavras: Como foi a adaptação dos alunos com deficiência em relação ao ensino remoto? Como foi o seu contato com os alunos?

Marco Aurelio Ribeiro: Eu fui gravar a minha aula no centro de mídias porque eu queria acessar meu estudante AEE. Eu mandei para eles e essas videoaulas me ajudaram muito. Pensei em todo o roteiro delas pensando nesse estudante.

Agora assim: eu atendo uma comunidade de bolivianos que mora no Brás. O pessoal começou a me ligar porque estava passando fome. Então, nessa pandemia, eu me vi ajudando a fazer cadastro para o auxílio emergencial, fui dar aula na porta da casa do menino… Como eu posso parar de dar aula para o menino que tira o som da cerâmica? Eu ia para o interior e levava [materiais] para a casa do estudante, mostrava para a mãe como fazer. As entrevistas com as mães [para saber mais informações sobre o estudante] aconteciam 23h, 0h, 1h. Quebrou os nossos horários.

No entanto, o próprio sistema da prefeitura foi difícil. Estamos falando de uma população de baixa renda, sem acesso à tecnologia. O livro didático, o filme de televisão, o link do WhatsApp funcionaram muito mais.

Eu atendi uma mãe e durante uma conversa eu estava confundindo uma aquarela. Em dado momento, o copo com a tinta caiu. Mostrei a ela que era esse tipo de movimento que ela deveria fazer com o filho autista. Você transforma o pai ou a mãe, em casa, em professor. Mas nada substitua.

Eu só faço as coisas porque tenho metodologia. O EAD só faz matar a interferência física do professor sobre o estudante. Mas o estudante de educação especial é diferenciado por falar por gestos, ecolalia (repetição), olhares. Esse processo de isolamento foi uma tentativa de manter o vínculo.

Palavras: O que nós, como cidadãos, podemos fazer para garantir uma educação de qualidade aos estudantes com deficiência?

Marco Aurélio Ribeiro: O acesso ao currículo não pode ser pensado em caridade. Eu, como professor, não sou um facilitador. Já temos uma narrativa com respeito à educação, então temos que entender que o que fazemos é dar acesso ao currículo – essa é uma prerrogativa do professor e da escola pública. E a inclusão está postada, quer as pessoas incluam ou não. Está na legislação. No momento em que o estudante está na escola pública, na sociedade, os meios têm que se adaptar a ele: piso tátil, por exemplo, [para deficientes visuais]. O espaço dele tem que estar garantido.

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