Na maior parte das escolas brasileiras, as diferentes disciplinas abordam seus respectivos temas de forma isolada, sem integração entre si. No entanto é possível — e até desejável, segundo especialistas — que professores promovam maior conversa entre suas matérias. Entenda o que são pluri, multi, inter e transdisciplinaridade e como aplicá-las em sua escola.

Antes de mais nada, é necessário compreender o que significa cada um desses termos. Jaime Oliva, geógrafo, professor do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP) e pesquisador na área de interdisciplinaridade, traz uma explicação didática de cada um desses modelos.

Segundo ele, multidisciplinaridade e pluridisciplinaridade são sinônimos. Nesse formato, as disciplinas trabalham em colaboração, mas mantêm seus conteúdos e métodos individuais. É como uma somatória de diferentes visões. 

Um exemplo que ajuda a visualizar o trabalho multidisciplinar é o de uma equipe que elabora políticas públicas. Dessa forma, um especialista de cada área dá sua contribuição sobre o mesmo assunto. Nas escolas, esse modelo costuma ser aplicado na discussão de problemas e resolução de projetos.

Subindo mais um degrau de interação, chega-se à interdisciplinaridade, que é, segundo Jaime, uma interação mais orgânica entre disciplinas. Aqui, as matérias cooperam e dialogam de forma intensa, procurando intersecções e construindo objetos de estudo conjuntamente. Em um estudo interdisciplinar, há a produção de uma metodologia única para as diversas áreas envolvidas.

“Um exemplo de interdisciplinaridade mais elementar é a criação de outras disciplinas que atuam nas intersecções dos objetos de duas anteriores: geohistória ou bioquímica, por exemplo”, explica Jaime. “Mas a interdisciplinaridade pode ir além e fazer integrações mais amplas e de acordo com o problema a ser abordado”, completa.

Por fim, transdisciplinaridade é algo que vai ainda mais além e “transcende o escopo das disciplinas”. “[A transdisciplinaridade] seria a capacidade de pensar o social como totalidade, como um único objeto. E talvez, aí, chegaríamos a uma única disciplina em que a própria ideia de estudar por partes desapareceria”, esclarece o professor da USP.

As vantagens da cooperação entre disciplinas

Jaime Oliva afirma que a interação entre as disciplinas é uma necessidade crucial para o aprendizado: “As realidades humanas produzidas socialmente são altamente complexas, conectadas a tantos fatores que recortá-las em disciplinas isoladas que não se comunicam com as outras é uma mutilação sem sentido”, explica.

O pesquisador aponta que adotar um método de ensino mais integrado faz com que todo o processo de aprendizagem esteja mais próximo da realidade e ajuda os alunos a darem sentido ao que aprendem. 

Ele afirma que, ainda que a integração das disciplinas sempre tenha sido importante, atualmente, com tamanho volume de informações circulando, ela é extremamente necessária. “Sem uma formação mais interdisciplinar (que deve incluir competências e habilidades bem desenvolvidas no campo das linguagens, por exemplo) não se tem um controle mínimo sobre a pertinência e a lógica das informações que nos chegam”, disse.

Além de aumentar a capacidade para lidar com o bombardeio de informações da era contemporânea, um ensino em que as disciplinas são integradas também resulta em um desenvolvimento intelectual mais sólido e criativo, segundo o professor da USP. Ele reforça que adotar métodos de disciplinas mais integradas não é apenas uma vantagem pedagógica, mas algo que leva a uma consolidação maior do conhecimento.

Como aplicar

“Os professores certamente já observam que muitos aspectos dos conteúdos que trabalham em suas disciplinas permitem um desenvolvimento mais amplo em colaboração com outras disciplinas”, analisa Jaime Oliva. Com essa visão, o especialista compartilhou algumas dicas e exemplos para os educadores que desejam adotar uma perspectiva de maior integração em seu trabalho.

Em um primeiro momento, o especialista explica que a colaboração pode acontecer entre disciplinas que estão mais próximas, da mesma área de conhecimento, partindo de um tema que já conste no programa de uma matéria e buscando a colaboração de outras disciplinas pertinentes. 

O professor de Biologia, por exemplo, pode desenvolver aulas complementares com os professores de História e Geografia sobre os biomas brasileiros. “E isso não violenta a formação de cada professor, ao contrário, dá mais sentido ao que ele faz, e certamente ele saberá enxergar novos caminhos e práticas com esse tipo de atitude”, avalia Jaime Oliva.

Ainda sobre a autonomia dos professores, para o especialista, é preciso que o corpo docente seja protagonista na escolha dos momentos de cooperação. “Há escolas que impõem e criam métodos e sistemas de professores trabalhando juntos em torno de projetos. Não me parece o melhor caminho, pois a criação docente já nasce subordinada a uma metodologia opressora”, opina.

O especialista reitera que a colaboração entre disciplinas nas escolas não significa uma desvalorização dos ensinos disciplinares. “O que se deve fazer é tentar mostrar que a colaboração entre as disciplinas representa um ganho para todos e potencializa os conhecimentos disciplinares que, ao saírem do seu isolamento, se aperfeiçoam.”

Quer saber mais sobre interdisciplinaridade? Confira no blog da Palavras os textos sobre a importância do planejamento no trabalho interdisciplinar e sobre o processo de contextualização dos conhecimentos no trabalho com interdisciplinaridade.