Hoje em dia, a tecnologia já é parte indissociável da educação, mas ainda há novas facetas da vida digital que podem ser integradas às salas de aula. Os memes são um bom exemplo. Onipresentes nas redes sociais, eles podem ser mais do que simples formas de piada e ajudar a dar contexto e leveza a temas complexos.

Viktor Chagas, professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFF (Universidade Federal Fluminense), acredita que eles podem ser um instrumento para aproximar o conteúdo escolar da vivência dos alunos. “Os memes podem contribuir para que esses jovens se engajem de diferentes maneiras”, explica.

Além de serem algo reconhecível para a geração nativa digital, os memes representam um momento social e cultural de um determinado lugar. “Geralmente eles importam referências da cultura pop, mas guardam uma relação direta com o humor e a cultura local”, esclarece Chagas. “Eles também refletem acontecimentos específicos e nos ajudam a reconhecer determinados atores políticos e sociais a partir de enquadramentos particulares”, completa.

O professor da UFF aponta exemplos de como os memes se inserem na realidade. Segundo ele, a forma como os memes retratam determinado político diz muito sobre aquela sociedade. Da mesma forma, durante a pandemia da COVID-19, foi possível observar como as pessoas estavam lidando com a situação.

Os memes podem ser entendidos no contexto educacional como um complemento da estratégia didática, podendo ser usados em todos os níveis de ensino. Em relação ao tipo de conteúdo que pode ser abordado usando os memes, o especialista destaca que eles podem ser integrados em diferentes disciplinas, ainda que sejam mais facilmente abordados nas que demandam uma reflexão crítica sobre a sociedade, como Sociologia, por exemplo. Já em disciplinas como Língua Portuguesa, é possível usar memes no estudo de variantes linguísticas.

Viktor Chagas faz uma correlação entre o uso de memes e a classificação indicativa de filmes para explicar que essa ferramenta pode ser usada com todas as faixas etárias, adequando o conteúdo de cada meme para a compreensão dos estudantes.

“O meme é uma linguagem como outra qualquer. Desse modo, assim como há filmes aconselhados para todas as idades e desaconselhados para as idades mais tenras, com os memes, não é diferente”, explica o professor da UFF. “Há memes cujo conteúdo é sexualizado, violento, cujas imagens e acontecimentos repercutidos não são adequados para crianças ou adolescentes”, completa.

O especialista pondera que não se deve fazer uma classificação simplista sobre o uso de memes, mas adequar ao contexto: “Eu não diria que os memes de modo geral sejam ou não aconselhados a essas idades. Esse tipo de leitura não deve ser feito de forma maniqueísta, como se os memes fossem intrinsecamente algo bom ou ruim”.

Ainda assim, Chagas faz uma ressalva sobre o uso de memes. Ele aponta que a linguagem é comumente associada a um conteúdo de humor e inofensivo, mas que eles podem carregar também a reprodução de um discurso nocivo. “Memes podem ser veículos do discurso de ódio e podem ajudar a consolidar estereótipos sociais e culturais danosos”, diz.

“Nesse sentido, é importante que esse tipo de debate seja fomentado em sala de aula. [Pensar] sobre o que rimos e por que rimos pode nos ajudar a compreender quem somos.” Um exemplo de reflexão a ser feita a partir de memes com conteúdos negativos é pensar por que esse tipo de representação diverte e o que isso diz sobre nós enquanto sociedade.

Outro ponto fácil de pensar quando o assunto é memes são as fake news, as notícias falsas intensamente compartilhadas nas redes sociais. Ele explica que “evidentemente, nem todo meme é uma fake news, mas toda fake news, de uma certa maneira, depende de uma disseminação viral para se constituir dessa forma. A desinformação só é eficaz quando larga e velozmente disseminada.”

O professor classifica como “de fundamental importância” discutir o que compartilhamos no meio digital, de forma a contribuir para uma formação midiática dos estudantes. “As escolas por muito tempo focaram sua formação na alfabetização da linguagem. Hoje nós estamos diante de uma nova necessidade de alfabetização, a alfabetização ou o letramento midiático. Os memes podem ajudar nesse debate”, conclui.

#MUSEUdeMEMES

Além de professor e pesquisador da UFF, Viktor Chagas também é coordenador do #MUSEUdeMEMES, um projeto da mesma universidade, que nasceu após uma série de encontros e exposições sobre o assunto. Ele funciona como um museu on-line, com um acervo fixo e exposições temporárias.

“Um dos objetivos por trás do #MUSEUdeMEMES é justamente o de lançar algumas provocações ao público. A primeira delas é a de gerar um certo desconforto, uma reflexão sobre por que não podemos ler os memes como objetos dignos de ocupar o espaço de um museu”, explica o coordenador do projeto.

Ele completa: “Além disso, em sentido oposto, lançamos também um questionamento sobre os próprios museus, que são geralmente pensados como instituições envelhecidas, quando, na realidade, preservam muito do contemporâneo. Por isso, no #MUSEU, nós estamos sempre atentos aos modos como os memes são compreendidos e tentamos discutir esses usos e apropriações.”

No contexto dos Estados Unidos, o site Know Your Meme é outra iniciativa que enxerga os memes além da sua característica efêmera. Ele funciona como um repositório de memes e pode ser uma fonte interessante para quem quiser trabalhar o tema em sala de aula, especialmente em aulas de idiomas.

Saiba mais sobre os conteúdos da Palavras na Sala do Professor!