Em entrevista para o Blog da Palavras, Fran Jaraba, autor de Divisão Azul: Um agente infiltrado, comenta sobre a produção da obra, as escolhas visuais para a composição do quadrinho, além da relevância e do cuidado na abordagem do tema presente no livro. Clique aqui para saber mais sobre o romance gráfico e garanta o seu exemplar.
Fran Jaraba é formado em Arquitetura, trabalha como ilustrador e professor de Desenho no Ensino Básico. Foi um dos pioneiros na produção de histórias em quadrinhos na Galiza, comunidade autônoma localizada no norte da Espanha.
Desde então, Fran Jaraba já trabalhou em mais de 70 títulos para diversas editoras espanholas, vários deles incluídos na The White Ravens, seleção de publicações organizada todos os anos pela Biblioteca Internacional de Munique, Alemanha, com obras vindas de diversos países para participar da Feira do Livro Infantil de Bolonha, na Itália, uma das mais importantes do mundo.
Palavras Projetos Editoriais: Você comenta, em depoimento presente no site da Palavras, como foi a construção de “Divisão Azul: um agente infiltrado”, que queria construir inicialmente uma história ambientada na Guerra Civil Espanhola, especialmente sobre as Brigadas Internacionais. Por fim, o personagem acabou deparando-se com a Divisão Azul e o livro passou a ter outra abordagem. Qual foi a sua motivação inicial para a construção de uma obra com essa temática?
Fran Jaraba: Inicialmente eu ia construir uma história ambientada nas Brigadas Internacionais durante a Guerra Civil Espanhola, mas quando comecei a me informar, apareceu a Divisão Azul e preferi ficar nisso. Me dei conta de que o tema das Brigadas já era muito explorado, e então eu achei que a Divisão era o cenário perfeito para a minha história. É um contexto histórico muito interessante para situar uma aventura de intriga e espionagem, ligado a uma situação de confronto ideológico e conflito pessoal interior. Ao mesmo tempo se descreve a vida na Divisão, que é algo pouco conhecido e também bem pouco explorado.
Palavras: O que te motivou a adotar o estilo presente em “Divisão Azul”, em vez de uma abordagem em preto em branco, por exemplo? Quais as referências que usou para a construção desse estilo de ilustração e paleta de cores?
Jaraba: Eu não me sinto confortável em selecionar previamente uma paleta. Me divirto muito usando as cores aleatoriamente e em seguida tento buscar a unificação por cenas fazendo um jogo com a regulagem digital da cor. A princípio, pensei em deixar as imagens, em vez de preto e branco, em sépia ou dois tons, mas ao final optei por uma cor pouco saturada, como a do cinema ou as dos documentários dessa época. Algo parecido ao que fez Spielberg em O Resgate do Soldado Ryan, onde incorporou lentes autênticas dos anos 40 nas câmeras.
Palavras: O tema do nazifascismo é sempre sensível em sua abordagem, não só por conta dos atos terríveis que ocorreram durante esse regime, mas também porque há sempre o perigo de uma análise anacrônica do período, com uma interpretação do ocorrido pelos olhos de hoje. Em “Divisão Azul”, o jovem Santi infiltra-se em um grupo de voluntários para lutar ao lado de Hitler na Segunda Guerra. Quais cuidados estão presentes na obra para denunciar os acontecimentos do período, sem cair em anacronismos?
Jaraba: Simplesmente tenho procurado ser fiel ao refletir sobre as mentalidades existentes nessa época. O leitor, especialmente se for jovem, vai enfrentar esses terríveis acontecimentos a partir da mentalidade do século XXI, e ele mesmo deve criar sua opinião com base nesse século. Mas todos os conflitos do tipo ético que haviam naquela época seguem presentes nesta, e pelo que está vindo atualmente, as características de algumas guerras que lamentavelmente estão acontecendo agora não são tão diferentes da Segunda Guerra Mundial, inclusive, eu diria que são quase iguais.
Palavras: Os capítulos de “Divisão Azul” são divididos a partir das localidades em que os personagens se encontram no decorrer da história. Como a obra pode trazer a perspectiva da Segunda Guerra, a partir das dinâmicas das localidades europeias nas quais o conflito ocorreu? Qual a importância das marcações espaciais presentes na obra?
Jaraba: O tempo e os cenários são aqueles que os voluntários espanhóis viveram para lutar contra os russos durante a Segunda Guerra Mundial. Para o leitor, é sempre estimulante situar-se em outra época e em outros lugares. Então, para ele, pode ser curiosa essa mudança progressiva de lugares, de uma cidade pequena da Galícia, como Santiago de Compostela, até um lago gelado no interior distante da Rússia. Tal mudança, no caso dos protagonistas, Santi e Marta, é acompanhada de uma transformação pessoal, tanto afetiva como nas posturas políticas e éticas.
Palavras: Você comenta em um depoimento sobre a potencialidade do contexto bélico para a literatura. Neste momento, estamos vendo uma série de conflitos armados em diversas regiões do mundo, seja na Europa, na África ou na Ásia. Como “Divisão Azul” pode despertar a reflexão sobre esses fatos tão atuais ao revisitar o período da Segunda Guerra Mundial?
Jaraba: Sim, sempre digo que o contexto bélico é como um cenário teatral ultrailuminado, ideal para tratar as questões fundamentais da existência, já que dentro ele consegue levá-las a um ponto especial de pressão e intensidade. Homero e Shakespeare já sabiam disso. O que é preciso evitar é contar as coisas a partir de um foco maniqueísta, com bons e maus. Todo conflito tem uma ampla escala de cinza. Além disso, eu gosto de deixar claro que toda guerra é horrível.
E claro, está sempre refletido no sofrimento da população civil. Isso está sendo visto agora nos conflitos atuais. Mas cuidado, que de alguma forma os soldados recrutados à força também são vítimas civis.
Palavras: Qual sua expectativa para o trabalho de “Divisão Azul” pelos professores e estudantes brasileiros? Você possui alguma recomendação a esse público?
Jaraba: Bom, já vi o material didático magnífico que vocês prepararam na Palavras. Posso acrescentar pouca coisa, acredito que os professores saberão perfeitamente como usá-lo nas salas de aula. Talvez o meu único conselho seria que devem ser os próprios alunos quem tirem suas próprias conclusões de forma ética, no lugar de induzi-las ou dar de maneira pré-fabricadas. Mas tenho certeza de que todos os professores já têm isso em mente.
Traduzido do espanhol por Sheila Folgueral
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