Confira a entrevista com o autor e ilustrador de Sem-no e Jorge, Fernandoapires. A ideia da obra, a criação das ilustrações e os desafios de escrever um livro foram alguns dos assuntos abordados. Confira o texto completo abaixo e saiba mais sobre a obra clicando aqui.

Nascido em São Caetano do Sul (SP), Fernandoapires é formado em Arquitetura. Como escritor, publicou mais de 15 livros, sendo finalista do Prêmio Jabuti, na categoria Literatura Juvenil, com a obra Um conto por um guaraná (Abacatte, 2015). Além de escrever e ilustrar suas próprias histórias, ele já ilustrou livros de autores como Tatiana Belinky, Daniel Munduruku e Yolanda Reyes.

Fernando A. Pires teve a ideia para Sem-no e Jorge após a leitura de uma notícia sobre uma criança que caíra no viveiro dos gorilas. Desesperados, os pais da criança se surpreenderam quando a gorila entregou o filho deles para os funcionários do zoológico. Instigado por esse acontecimento real, o escritor inventou as aventuras da cadelinha que corre solta pelo zoo, convidando o leitor a pensar sobre o que move o ser humano e os animais nos cuidados uns dos outros.


Palavras Projetos Editoriais: Como surgiu a ideia de criar “Sem-no e Jorge”?

Fernandoapires: Essa pergunta é sempre muito difícil de responder. Como geralmente passa um bom tempo desde a escrita de um livro até a publicação, eu acabo esquecendo como a coisa toda começou. Para responder, eu precisei rever meus primeiros esboços do texto. Na parte do autor, contei que escrevi Sem-no e Jorge depois de ver uma reportagem em que uma criança de três anos cai na jaula dos gorilas em um zoológico, e desmaia em seguida, deixando os pais e os funcionários desesperados.

O que me impressionou foi o desfecho dessa história, em que uma das gorilas cuidou da criança e a devolveu em segurança aos pais. Esse acontecimento ficou na minha cabeça, mas na verdade não foi daí que surgiu Sem-no e Jorge. A reportagem me ajudou a desenvolver a história, mas lembrei agora, vendo meus rascunhos, que o estalo inicial para criar veio de um pensamento, logo depois de visitar um zoológico, quando ele estava quase fechando; a gente estava saindo, já não havia quase visitantes, e senti uma certa melancolia ao ver os animais sozinhos nas suas jaulas, pensei que eles não iam ter mais a “companhia” dos visitantes, e que ficariam tristes por causa disso durante a noite.

Fui pesquisar um pouco e aprendi que a importância dos zoológicos vai além daquela de mostrar animais que talvez nunca tivéssemos a oportunidade de ver. Nos zoológicos, é feito também um trabalho importantíssimo de preservação de espécies ameaçadas e de conscientização e educação do público. Essas informações me alegraram ao perceber que os animais estariam bem acompanhados pelos profissionais do zoológico depois que ele fecha. Mesmo assim, eu pensei: e se uma cachorrinha pudesse alegrar todos esses animais durante a noite? E se ela tivesse uma sabedoria que falta a nós, seres humanos? E se ela fosse incansável e sentisse a necessidade de ser uma espécie de mãe de todos os animais? Daí surgiu a Sem-no.

Palavras: Como ocorreu a escolha do estilo de ilustração e paleta de cores para essa obra?

Fernandoapires: Na minha infância, e mesmo quando trabalhei com arquitetura, eu quase não fazia desenhos coloridos, eram sempre a lápis preto ou nanquim. Eu gosto de coisas mais simples. Com o tempo, fui entrando no mundo das cores, para ser um ilustrador mais completo, mas tenho boas recordações desses desenhos, e quando posso, volto a eles. Na época em que iniciei o projeto gráfico de Sem-no e Jorge, perguntei para a editora Vivian Pennafiel o que ela achava de usarmos o preto e o branco para as ilustrações. Ela topou na hora, falou que o público leitor para um livro como o nosso já tem uma vivência maior, já passou por livros de diversos estilos, diversas técnicas de colorização, mas talvez nunca tenha lido um livro mais “controlado” em termos de cores.

Criar a Sem-no me fez olhar muitas fotos de cachorrinhos até ela chegar na aparência que tem hoje, magrelinha e com grandes orelhas. Uma autêntica vira-lata. E para desenvolver o estilo da ilustração, achei que deveria ser um traço despojado, imperfeito, muitas linhas não fecham nas outras linhas, imaginei que assim teríamos uma boa combinação com a pintura em preto e branco.

Outra solução importante também para o projeto gráfico foi a ideia do rodapé ilustrado e animado. Como o livro não comportava o desenho de todos os animais, que geralmente estão em um zoológico, imaginei um jeito de muitos deles se mostrarem e poderem passear pelo livro. O mapa do zoológico foi ideia da Vivian e arrematou muito bem o projeto.

Palavras: Suas três obras que serão lançadas em breve pela Palavras têm semelhanças como os animais sendo protagonistas. O que te motivou a escrever essas obras?

Fernandoapires: A motivação vem exatamente da relação do animal com o animal humano. OSWAAAAALDO! e Oswaldo treinador esportivo têm como protagonista o macaco Oswaldo, uma criança que ainda está aprendendo sobre o mundo. Então ele erra muito ao tentar fazer amizades, por exemplo, mas ele é meio cientista também e, na tentativa e erro, vai evoluindo para entender o mundo e os outros. Achei interessante criar o Oswaldo porque a criança leitora poderia se identificar com as dúvidas que ele tem sobre o mundo, dúvidas como, por exemplo: qual a melhor maneira de convidar um amiguinho para brincar? Coisas que parecem simples, mas não são, principalmente para quem está tentando pela primeira vez.

No caso da Sem-no, ela mostra que tem uma sabedoria que muitas vezes nos falta como seres humanos. Já o Oswaldo tem a curiosidade de uma criança, o que também ensina, e muito, a nós, adultos.

Palavras: Qual foi o principal desafio na criação de “Sem-no e Jorge”? E das outras obras?

Fernandoapires: Em Sem-no e Jorge eu precisava emocionar, mas também queria divertir. Talvez esse fosse o meu maior desafio. Era preciso que o leitor se sensibilizasse com o que poderia acontecer com a cadelinha quando ela é descoberta, mesmo que nessa hora o leitor tenha somente uma leve desconfiança das intenções reais dela. Por outro lado, eu queria também que as passagens fossem atraentes, divertidas, até para fazer um contraponto com o desfecho.

No OSWAAAAALDO!, que foi o primeiro dessa série, era mais ou menos o contrário: eu precisava divertir, mas queria também emocionar. Era vital que ele fosse o mais engraçado possível, chegando, às vezes, ao absurdo. Para o encontro com cada animal, era preciso ter uma estratégia diferente em cada um, e assim não ficar repetitivo; era importante que o leitor não perdesse o interesse. E ao mesmo tempo, eu tinha que conduzir para um final que aliviasse toda a tensão e ansiedade do macaco para encontrar um amigo, uma tensão que percorre todo o livro. Acho que eu consegui, se for ver a reação de vários alunos, que se identificaram muito com Oswaldo, e estavam bastante curiosos sobre como criei o livro. A ilustração do OSWAAAAALDO! é bem colorida, ao contrário da Sem-no, para contribuir com a diversão.

O Oswaldo treinador esportivo é o segundo livro da série, e o maior desafio foi manter o espírito do OSWAAAAALDO!, que tanto divertiu esses alunos, mas não repetir piadas e sempre tentando acrescentar algo novo, até para mostrar que o Oswaldo está crescendo e evoluindo, como acontece com toda criança.

Palavras: Qual sua expectativa para os jovens leitores e estudantes que conhecerão suas histórias?

Fernandoapires: Espero que eles se divirtam e se emocionem tanto quanto eu, enquanto as escrevia e desenhava, e que voltem a lê-las mais tarde porque sentiram saudades dos personagens. E se descobrirem, a cada leitura, novos detalhes que não perceberam nas leituras anteriores, ficarei realizado como autor.

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