Em entrevista concedida à Palavras Projetos Editoriais, a designer Carla Chagas comenta sobre a produção dos projetos gráficos de Pelos Olhos de Minha Mãe e Quimera, lançamentos da Palavras do primeiro trimestre de 2022, e aprovados no PNLD 2021 Literário. Os diferentes desafios e as soluções encontradas para cada obra, além da importância do projeto gráfico e do trabalho visual em obras literárias voltadas ao público infantil e juvenil fizeram parte da conversa.

Carla Chagas nasceu na cidade de Recife (PE), em 1978. Durante toda a adolescência morou em Fortaleza, onde concluiu o bacharelado em Publicidade e Propaganda, em 2001. No final do mesmo ano, ingressou na pós-graduação em Design da Informação, da UFPE, voltando para Recife e iniciando sua carreira.

Durante mais de 15 anos, trabalhou como Diretora de Arte e de Criação em diversas agências de Pernambuco e São Paulo. No entanto, nunca se contentou com rótulos e, paralelamente, sempre buscou experimentar diferentes formas de atuar como criativo. De campanhas a padrões, passando pelo design de experiências e, mais recentemente, o design de livros, ela acredita que “todo projeto criativo, seja um evento, uma marca ou um catálogo de moda, tem que comunicar verdade, propósito e expressar sua essência ”.


Palavras Projetos Editoriais: Como foi a produção do projeto gráfico das obras? Eles foram diferentes de experiências anteriores que você teve? Quais desafios foram colocados a você nessa produção?

Carla Chagas: Como criativa, sempre prefiro ambientes e desafios que me causaram deslocamentos e me fizeram ocupar outros papéis. Na minha experiência profissional, eu ainda não havia projetos desenvolvidos de livros e tinha consciência de que seria uma entrega e um processo enriquecedores. Acho que o que mais me chamou atenção foi o caráter único e quase definitivo desse produto criativo: um livro. Um objeto físico, tangível, com o qual as pessoas estabelecem diferentes formas de se relacionar. Vão ler sentados, deitados, no ônibus? Tudo isso me parecia solicitado e me fez aceitar de cara o convite. 

Palavras:Quais foram as principais diferenças na produção do projeto gráfico de “Quimera” e Pelos Olhos de Minha Mãe?

Carla: Foram processos bem distintos. Em Quimera, senti que o projeto precisava de uma mão muito leve para não entrar em conflito com a mão da Lily Carrol, ilustradora do livro. Pra mim, a força do projeto gráfico já estava na mão dela, fortemente influenciada pelos traços pesados da xilogravura e dos HQs. Então busquei pensar em soluções mais “de acabamento”, unidade, coerência, tipografia e cor. Já em Pelos Olhos de Minha Mãe, o mergulho foi mais profundo. Partiu de pesquisas, conversas imersivas com a autora e algumas experimentações. O levantamento de possibilidades para costurar os textos de Laura e de Iolanda, e mais outros trechos encontrados no processo de organização da obra, me levou a muitos caminhos. E o filtro pra que a gente chegasse no melhor deles, ou pelo menos escolhesse com firmeza algum deles, foi justamente uma frase onde Laura se dizia contente com as tantas formas de lembrar da mãe, com o tanto de registros. E foi usando essa lente de Laura que eu passei a enxergar todo o conceito do livro, sem deixar de lado uma sensibilidade bem aflorada para tentar conhecer Iolanda também e permitir que a construção fosse se impondo por assunto, por trecho, por memória.

Palavras: Em relação a “Quimera”, como foi trabalhar a correlação entre o texto e as ilustrações em uma temática tão profunda?

Carla: Tentei trabalhar essa correlação buscando dar “fôlego” para o leitor entre as páginas. Quando a temática, que é esse trauma histórico tão nosso, se apresenta no Quimera, achei necessário mostrar certo silêncio e abrir espaço para o leitor conseguir absorver tudo aquilo. 

Palavras: Já em “Pelos Olhos de Minha Mãe”, há um conjunto diverso de materiais, como trechos do diário de Iolanda, negativos e fotografias, por exemplo. Como foi prever cada uma dessas situações e quais soluções você teve para dar o destaque devido a cada um dos materiais?

Carla: A única forma que eu encontrei para organizar os diversos materiais foi respeitando as particularidades de cada um e não tentando prever muito as situações. Pensei em simplesmente “acolhê-los” buscando dar a devida importância visual ao que tinham de único e criando consistência gráfica através de soluções como, por exemplo, as tipografias-vozes de mãe e filha, os padrões presentes em todo trecho que era do diário de Iolanda e a barra colorida na lateral remetendo às diversas fases. Elementos que vão se tornando reconhecíveis ao longo do livro. 

Palavras: Quando se pensa em literatura no geral, inclusive no caso específico da literatura infantil e juvenil, o papel do projeto gráfico muitas vezes fica ofuscado, e vê-se muito mais o papel do autor no processo de composição da obra. Qual é a sua opinião sobre o papel do designer/diagramador na produção de uma obra literária infantil e juvenil? O quanto de autoria, na sua visão, não há projeto gráfico de uma obra literária?

Carla: A minha opinião é de uma designer, né? 🙂 Então, acho que o papel do projeto gráfico é fundamental para a experiência do pequeno e médio leitor. Da escolha na prateleira até, como eu já disse anteriormente, a situação em que o livro estará “consumido”, tudo isso passa pela cabeça do designer para que o livro se conecte ao público. Por outro lado, o quanto de autoria há no projeto gráfico é uma coisa que está completamente ligada a cada obra, não vejo como algo universal. Alguns projetos gráficos são mais autorais e outros menos.

Palavras: Qual sua expectativa sobre a recepção dessas obras em sala de aula?

Carla: Torço e espero que as obras sejam instigantes para o trabalho na sala de aula e se conectem com os leitores das formas mais diversas. Gerando identificação, reconhecimento, provocação ou estranhamento. Mas que seja uma “presença” marcante, como aquele professor inesquecível que todo mundo tem um.

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